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Crítica: Viver a Vida – Jean-Luc Godard (1962)

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    Equipe
  • 22 de dez. de 2018
  • 4 min de leitura

Nana é uma jovem que abandona o seu marido e o seu filho para iniciar sua carreira como atriz. Para financiar sua nova vida começa a trabalhar numa loja de discos, mas não ganha muito dinheiro. Como não consegue pagar o aluguel, Nana é expulsa de casa e decide virar prostituta. (Fonte)

Quando falamos da Nova Onda Francesa ou como é conhecida, a nouvelle vague, estamos também falando de uma assinatura forte de um diretor que imprime seus estilo próprio no filme e que o torna parte de si, a direção é a coisa mais perceptível do filme. Se tratando de Jean-Luc Godard essa assinatura ficaria bem visível visto que anteriormente havia lançado: Acossado e Une Femme est Une Femme, dois filmes que contém essa característica do diretor que possui diálogos memoráveis, certa paixão pela Paris que mostra e também inventivas cenas que eram construídas a partir de um senso de estética. Dessa vez é diferente, o foco principal e grande estrela no filme é a atriz e musa da nova onda francesa, Anna Karina.


Logo nos primeiros minutos dos créditos iniciais podemos observar os vários lados do rosto de Anna Karina, sua face, completamente expressiva é explorada pela câmera de uma forma quase que como se ela estivesse posando para um pintor, seus olhos tentam nos dizer alguma coisa, algo que só descobriremos posteriormente, sua culpa, seus desejos, suas lutas. Naquele momento pode-se perceber o tom do filme que se seguiria, um estudo de personagem de uma jovem que só está tentando sobreviver de uma forma confortável em um mundo onde uma mulher não tinha tanta autonomia.

A história segue doze momentos da vida de Nana, doze momentos aleatórios e desconexos entre si, mas que seguem uma lógica cronológica. Durante a maior parte desses momentos, a câmera de Jean-Luc permanece imóvel, quase querendo parecer imperceptível, ela é usada somente quando é estritamente necessário, o foco ali é a relação que está acontecendo entre Nana e quase sempre mais um personagem. Planos e contra planos são produzidos sem um corte intermediário e sim com a câmera correndo em um trilho trocando de ângulo, algo que eu não havia visto até agora.


É conhecido que os críticos da Cahiers Du Cinèma que viriam posteriormente se tornar os diretores da nouvelle vague, são apaixonados pela arte do cinema e nesse filme em uma Paris aparentemente morta, o cinema é visto como a saída para os problemas de Nana, assim como é tratado inúmeras vezes como algo milagroso ou glamouroso. Em certo momento, Nana assiste ao filme de Carl Theodor Dreyer, “Paixão de Joana d’Arc” e uma parte do diálogo é enfatizada e que pode servir de reflexa sobre o filme que estamos assistindo e analisando, “Não compreendemos as rota e sim só o final”. Assim como Joana d’Arc não conseguiu compreender os caminhos que deus colocou-a pra traçar ela sabia que ao final alcançaria a bênção divina, Nana passou por muitos problemas, pessoas, caos e “becos escuros” sabendo apenas que a sua finalidade era conseguir sobreviver, pagar o aluguel e viver a sua vida do jeito que gostaria.

Em certo momento, Nana reflete com sua amiga sobre o quão responsáveis somos sobre nossa vida e nossas ações, ela se declara inteiramente responsável sobre todos os aspectos de sua existência, ela basicamente está declarando que ela mesma poderia não passar por tudo o que ela passa, afinal, ela possuía um marido e um filho com os quais estava vivendo bem financeiramente. Apesar de sua primeira experiência se prostituindo tendo sido visivelmente desconfortável, ela parece estar exatamente onde ela quer e onde ela escolheu estar. Com o passar do tempo é perceptível que ela se sente mais segura e satisfeita consigo mesma com o que alcançou através da prostituição.


Esse filme me fez pensar que a vida naquela época poderia ser muito mais interessante, os sujeitos com os quais Nana esbarra nos cafés e bares de Paris sempre possuem algo para conversar com ela, sempre entre os cigarros e as xícaras de café. Talvez seja maneirismo do diretor em utilizar esses momentos nos filmes para talvez demonstrar a efemeridade aleatória da vida em contraste com os tipos interessantíssimos de pessoas com as quais podemos ter uma boa conversa se estivermos abertos a isso. Tudo isso, em minha opinião, é algo que talvez não tenhamos mais hoje em dia, parece loucura nos dias de hoje, com as redes sociais que nos trazem cada vez mais próximos e cada vez mais longe um do outro, entrar uma cafeteria, acender um cigarro e ter uma ótima conversa com um completo desconhecido enquanto tomam uma xícara de café.

Na minha condição de crítico, meu querido cinéfilo, eu estou sujeito a estar equivocado ou apenas exercer a minha liberdade de expressão e apresentar duas visões sobre o mesmo tema. Pois é assim que trabalhamos, nunca estamos certos, estamos sujeitos à mudança de opinião dos outros e às vezes de nós mesmos. Nesse caso gostaria de apresentar outra visão em relação àquela que anteriormente expressei sobre Godard se esconder nesse filme em detrimento do florescimento de Anna Karina. Talvez a marca de Jean-Luc Godard nesses filmes seja se esconder, talvez ele se faça presente através da não constância na construção de sua mise-em-scène nos longas que produz, talvez a sua ausência seja sua presença forte, estampada na nossa cara. Agora, dito isso, qual das duas de minhas expressões é a correta, cabe à você decidir, eu mesmo acredito que as duas visões se justificam na tela e é por isso que nós amamos os filmes.


São filmes como esse que se apropriam dessa língua maravilhosa que é o francês, sempre acompanhados de um café e um cigarro, ao som de Jean Ferrat ou Charles Aznavour que nos fazem cinéfilos apaixonados pelo cinema francês e pela França.

Viver a Vida é um filme dirigido por Jean-Luc Godard e lançado em 1962.


Escrito por Gabriel Pinheiro

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