Na França do século XVIII, Marianne (Noémie Merlant) é uma jovem pintora que recebe a tarefa de pintar um retrato de Héloïse (Adèle Haenel) para seu casamento sem que ela saiba. Passando seus dias observando Héloïse e as noites pintando, Marianne se vê cada vez mais próxima de sua modelo conforme os últimos dias de liberdade dela antes do iminente casamento se veem prestes a acabar. (Fonte)
Vencedor do Melhor Roteiro e do Queer Palm (prêmio independente, dado a filmes com temas LGBTQ+) no Festival de Cannes, o novo filme de Céline Sciamma (de Tomboy) impressiona pela qualidade de sua fotografia, atuações poderosas e uma das histórias de amor mais honestas e bem retratadas do cinema atual.
O conflito central de Retrato centra-se na pintora Marianne, uma pintora, que é contratada por uma família rica para que pinte o retrato de sua filha mais nova – Héloïse – sem que ela saiba, na mansão isolada da família. O retrato será enviado para seu possível marido para que ele decida se quer casar ou não. Marianne deve esconder seu trabalho porque Héloïse se recusou a posar para o último pintor contratado.
Os personagens centrais de Retrato são mulheres presas em suas situações: Marianne deve fazer seu trabalho às escuras, em nome de sua arte; Héloïse é um objeto de desejo que vai ser julgada por sua beleza, para um possível casamento ao qual ela mesma se opõe.
O maior trunfo de Retrato, no entanto, é sua fotografia. Não é nenhum exagero dizer que cada plano pode facilmente ser transformado em uma pintura barroca. O design da produção desenvolve muito bem os interiores da mansão, os vestidos coloridos e os cenários belíssimos que são visitados. O trabalho de cores é muito atencioso, tornando cada cenário, cada vestido, uma peça memorável da obra.
A direção de Sciamma remete a um ballet. Há um senso claro de coreografia de cena em cada interação entre as personagens, no mise-en-scène, o trabalho de câmera e entrega do diálogo. O que é incrível quando o filme em questão é um romance de época que é 99% diálogo.
Um dos aspectos mais marcantes do filme é algo complexo, é a forma com que a intensidade do amor das personagens é comunicado através da linguagem audiovisual do filme. O filme, em sua maioria, é calmo, preciso e sem muita música. Há somente três momentos com música nesse filme, e todos eles utilizam a música como uma demonstração clara da paixão que floresce entre as personagens.
O final operístico instala no espectador um senso do amor nostálgico, algo que acontece poucas vezes na nossa vida, o sentimento de perda pelo que poderia ter sido, mas nunca poderia ser. Toda a intensidade do filme é jogada para a última cena: temos uma orquestra tocando, o som vai aumentando, a câmera vai se aproximando, as lágrimas escorrem, e a mensagem fica clara, em um momento claro de paixão, de lembrança, de nostalgia.
Retrato de uma Jovem em Chamas pode parecer, na sua superfície, apenas mais um filme de romance de época. Mas, durante toda a sua duração, é retratada uma história de amor, de uma forma muito bem cuidada, filmada com precisão e cuidado, e que ficará na memória.
Escrito por Fernando Cazelli
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