Os moradores da cidade de Bacurau, no interior do Pernambuco, descobrem que sua cidade desapareceu de qualquer mapa. Ao mesmo tempo uma série de acontecimentos estranhos dão a entender que coisas suspeitas estão acontecendo entorno da cidade.
Dirigido por Kleber Mendonça Filho e Juliano Dorneles, o filme ganhou o prêmio do júri no festival de Cannes e teve sua estreia no Brasil abrindo o festival de Gramado. Se me pedissem para descrever bacurau em uma única palavra, não seria outra além de catártico.
O filme tem uma construção narrativa incrível e a todo o momento instigante, um ritmo extremamente bem pensado, que modela os sentimentos do filme de uma maneira natural e fluida, isso sem contar com a beleza visual que o filme carrega extremamente bem realizado.
O filme coloca o dedo nas feridas do Brasil de 2019, a violência, o descaso para com as populações mais vulneráveis, a seca e a não só banalização, mas também erotização da violência. Em alguns poucos momentos ao fazer essa crítica os diretores pesam demais a mão (principalmente em alguns diálogos), no entanto mesmo nesses momentos a história contada pelo filme é plausível.
Infelizmente não foge muito da nossa realidade se algo parecido com o que ocorre no filme acontecesse. Na realidade já acontece, não é incomum que pequenas cidades desapareçam pura e simplesmente por interesses econômicos de pessoas que nunca tiveram o mínimo contato com essas populações.
Não existem heróis em Bacurau, existe uma população tentando de todas as formas viver. Os moradores da cidade vivem como uma família, todos se conhecem e todos se ajudam, a cidade vive em coletividade. Já os vilões existem e fica muito claro quem são, eles são aqueles que só se importam com si próprios e não enxergam sequer a humanidade no diferente.
A narrativa do filme é realmente incrível, mas toda a sua concepção visual e sonora também são um deleite audiovisual. Se tem algo que Kleber Mendonça Filho sabe fazer bem na minha opinião é contar uma história através dos enquadramentos, isso é algo que vem de seus filmes anteriores e que só aumenta em Bacurau. Sem dúvida a visão estética de Juliano Dorneles, que havia trabalhado na direção de arte dos filmes tanto em Som ao Redor (2013), quanto em Aquarius (2016).
O trabalho de fotografia é incrível e extremamente criativo, durante todo o filme existem várias brincadeiras com a luz que dão uma grande beleza.
Outro ponto que merece grande destaque no filme é sem sombra de dúvidas a trilha sonora, misturando ritmos brasileiros com músicas cheias de sintetizadores a lá John Carpenter (tendo inclusive uma música do próprio John Carpenter na trilha sonora).
O Clima do filme é modulado por essas músicas de maneira não sutil, mas com muito estilo. Dois universos musicais coexistem de forma natural, sem que se questione que haja uma falta de coerência entre os dois.
Enfim, Bacurau é um ótimo filme, certamente o melhor que assisti lançado em 2019 até o momento, uma experiência como poucas e extremamente brasileira, no melhor sentido da palavra. O filme é catártico e repito isso dando o exemplo que durante a melhor cena do filme o público não se conteve e aplaudiu sem que tivesse acabado a projeção.
Realmente não foi necessário um protesto por parte da equipe como se houve em Aquarius, porque o filme em si é um grande protesto. Um protesto contra o descaso, um protesto a favor da cultura.
Escrito por João Cardoso
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